17/11/2021 - Por: G1 - Globo.com EU ATLETA
O câncer de próstata é o câncer mais comum entre os homens. De acordo com dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca), um homem morre a cada 38 minutos no Brasil por conta da doença. E um dos remédios para a prevenção e tratamento é justamente a atividade física regular. Uma série de estudos indicam o potencial da prática de exercícios tanto na redução do risco de desenvolvimento deste tipo de câncer como numa melhor evolução da doença. Entre eles, um publicado este ano no jornal científico JAMA Oncology, que avaliou que o exercício pode ser uma intervenção eficaz para melhorar a aptidão cardiorrespiratória e suprimir a progressão do câncer de próstata em pacientes submetidos à vigilância ativa.
Para explicar os efeitos positivos do exercício sobre o quadro, o Eu Atleta conversou com o médico urologista Mitchell Humphreys, da Mayo Clinic, e com os médicos endocrinologistas e do esporte Ricardo Oliveira e Clayton Macedo.
O estudo
O estudo publicado este ano por um grupo de pesquisadores da Universidade de Alberta, no Canadá, avaliou o impacto do treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) em pacientes com câncer de próstata. Na pesquisa, os pacientes que apresentavam o diagnóstico da doença foram submetidos à chamada “vigilância ativa", estratégia na qual nenhum tratamento medicamentoso ou cirúrgico é feito. Ou seja, os pacientes são apenas acompanhados com vigilância.
Metade dos participantes foi colocada num programa estruturado de HIIT três vezes por semana, com sessões de treino na esteira atingindo uma frequência cardíaca bem alta (em torno de 85% a 95% do consumo máximo de oxigênio). Os indivíduos foram avaliado durante 12 semanas.
Como resultados, além de uma esperada melhora da capacidade cardiorrespiratória, o grupo que participou do programa de treinamento físico intensivo apresentou níveis menores do antígeno específico da próstata (PSA), bem como uma menor taxa de um marcador de proliferação celular do tumor.
- Com isso, devemos ressaltar a importância da prática regular de atividade física na prevenção de diversos tipos de câncer, incluindo o de próstata. E os dados disponíveis indicam que o exercício físico, sobretudo o de mais alta intensidade, pode ajudar a reduzir o crescimento tumoral em pacientes com câncer de próstata - aponta Ricardo Oliveira.
De acordo com o endocrinologista Clayton Macedo, a grande informação desse estudo é que, para os pacientes que fizeram exercícios de alta intensidade, a evolução do câncer de próstata foi diminuída e a capacidade aeróbica dos indivíduos foi melhorada. Mas por se tratar de uma avaliação de 12 semanas apenas, é necessário analisar mais a longo prazo esses pacientes. Além disso, é importante ressaltar que o exercício físico deve ser uma ferramenta auxiliar no quadro, não substituindo o tratamento médico.
Ou seja, os pacientes têm que seguir fazendo seus exames de rotina dentro da preconização adequada pelo médico e no caso de os níveis de PSA estarem alterados, os indivíduos têm que seguir a orientação do médico. O exercício físico é uma ferramenta a mais para essa proteção e talvez, a longo prazo, seja uma forma de melhorar bastante esse quadro oncológico.
- Esse artigo impacta bastante principalmente na parte da educação para a prevenção e também para quebrar um pouco o estigma de que paciente que tem câncer está muito doente e não pode fazer exercício. É exatamente o contrário. O exercício físico melhora a imunidade, o humor e uma série de outros aspectos físicos e mentais. Há evidências de que a atividade física reduz também a progressão do câncer de mama. Ninguém está dizendo que o exercício irá curar a doença, contudo, melhora uma série de fatores e diminui o risco cardiovascular encontrado nesses pacientes, que podem até morrer de uma complicação desse tipo - explica o médico.
Clayton ainda ressalta que, por esse motivo, ao fazer exercício físico, o paciente estará se protegendo e aumentando sua sobrevida.
- Essa mensagem vale a pena porque é algo bem importante e impactante até mesmo para os próprios especialistas, às vezes eles têm uma ideia errada. Eu trabalho bastante com exercícios e coordeno um serviço de referência na Universidade Federal de São Paulo e, muitas vezes, temos dificuldade até de convencer os colegas de que os pacientes mesmo em quimioterapia, mesmo submetidos ao tratamento que for ou mesmo cirurgia, obviamente respeitando o repouso pós-operatório, são beneficiados pelo exercício físico - destaca.
O que é a próstata?
De acordo com a Sociedade Brasileira de Urologia, a próstata é "uma glândula do sistema reprodutor masculino, que pesa cerca de 20 gramas, e se assemelha a uma castanha". A mesma se encontra abaixo da bexiga e tem como papel mais importante a produção de esperma.
Principais fatores de risco para o câncer de próstata
- Histórico familiar de câncer de próstata: pai, irmão e tio;
- Etnia: homens negros sofrem maior incidência deste tipo de câncer;
- Obesidade.
Principais sintomas da doença
De início, a doença não apresenta sintomas. Na grande maioria dos casos (95%), quando a pessoa sente algo, o tumor está em um estágio avançado, o que torna o processo de cura mais difícil. No estágio mais avançado, os sintomas costumam ser:
- Dor óssea;
- Dor ao urinar;
- Vontade de urinar com frequência;
- Presença de sangue na urina e/ou no sêmen.
Prevenção e tratamento
Em relação à prevenção da doença, a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) informa que todos os homens a partir dos 50 anos de idade, mesmo com ausência de sintomas, devem fazer os exames preventivos (toque retal e exame de antígeno específico da próstata - PSA). Para os homens que possuem histórico familiar da doença, o recomendado é que se inicie os exames preventivos dez anos antes da idade que o familiar foi diagnosticado com a doença. Por exemplo, se um pai teve câncer de próstata aos 50 anos, o filho deve tomar os cuidados preventivos a partir dos 40 anos.
Quanto mais cedo o câncer de próstata for diagnosticado, melhor será a chance de cura ou prevenção da propagação da doença. É importante considerar os fatores de riscos individuais, e o diagnóstico precoce oferece maior oportunidade para diferentes estratégias de tratamento com mais possibilidade de cura da doença.
- O tratamento é um assunto complexo e eu recomendaria consultar um urologista para discutir toda a diversidade de opções de tratamento, tolerância individual ao risco e objetivos de vida. Em termos, não existe uma maneira única de prevenir o câncer de próstata. Uma vida saudável com uma dieta balanceada e um programa de exercícios pode ajudar a reduzir o risco, mas a vigilância sobre o rastreamento e a detecção precoce são fundamentais para identificar o tumor precocemente - aponta o urologista Mitchell Humphreys.
O médico ainda ressalta que a maioria dos cânceres de próstata não é uma sentença de morte. Cada indivíduo e cada câncer é diferente, mas com tantos avanços nos últimos 10-15 anos, há esperança de cura. Por isso é importante estar informado e ter um papel ativo na saúde, preservando não apenas a vida, mas também a qualidade de vida.
Exercícios físicos x câncer de próstata
Afinal, de que forma o exercício físico pode ter um efeito protetor contra os tumores? De acordo com o médico urologista Mitchell Humphreys, há vários benefícios proporcionados pela prática esportiva quando pensamos na doença, como:
- Controle de peso;
- Estímulo do sistema imunológico para combater o câncer;
- Redução da inflamação;
- Geração de endorfina, que ajuda com uma sensação geral de bem-estar;
- Controle dos níveis de insulina no sangue, que têm sido associados à progressão do câncer;
- Redução do risco de depressão.
A saúde geral é um indicador importante da sobrevida como um todo e da sobrevida específica do câncer. De acordo com Humpreys, a pessoa fisicamente ativa se sai melhor após o diagnóstico inicial e a longo prazo.
- Quanto melhor a saúde de um homem, melhor seu prognóstico associado ao câncer em todos os estágios. Além dos benefícios gerais para a saúde, o exercício demonstrou ser um importante preditor de prognóstico e sobrevida para o câncer. Além disso, pode afetar a progressão e o desenvolvimento de doenças adicionais. Quanto mais saudáveis ??forem os homens com câncer de próstata, melhor será sua sobrevivência - destaca o médico urologista.
Estudos também mostram que o exercício físico, mesmo depois do diagnóstico, traz uma série de benefícios em relação tanto ao desenvolvimento desse câncer quanto à evolução e o prognóstico do mesmo. A pesquisa publicada no jornal científico Supportive and Palliative Care, por exemplo, aponta que o exercício está emergindo como um medicamento direcionado para melhorar o controle dos sintomas, modular a biologia do tumor e retardar a progressão do câncer de próstata, com potencial para aumentar a sobrevida global.
- Em alguns casos, esses pacientes que têm câncer de próstata, principalmente em um estágio avançado, recebem medicações ou um bloqueio na produção dos hormônios masculinos, exatamente porque a testosterona é estimuladora direta do câncer de próstata. Então, como esses indivíduos têm a testosterona bloqueada para tratar o câncer, acabam perdendo a libido, mudando muito a composição corporal, ganhando gordura principalmente abdominal e reduzindo a massa e o tônus musculares. E é aí que entra o exercício, pois tem exatamente o papel invertido: ele aumenta a massa muscular, diminui a gordura abdominal, melhora a libido, melhora o humor e melhora a força muscular. Assim, antagoniza os efeitos colaterais dessa medicação que está sendo usada para tratar o câncer de próstata - explica Clayton Macedo.
O endocrinologista ainda destaca que existe o mecanismo da gordura corporal cria um ambiente propício para as células do câncer se desenvolverem, portanto, além de todos esses benefícios, o exercício neutraliza os efeitos colaterais dos tratamentos.
E ainda há diversas evidências de que ele pode diminuir o desenvolvimento do câncer de próstata, pois em torno da próstata o homem que desenvolve o câncer forma um microambiente que faz as células se diferenciarem e aumentarem tanto em número quanto em tamanho, o que provoca o crescimento do tumor. Dessa forma, o exercício físico cria um ambiente desfavorável para essas células se proliferarem naquela região.
Portanto, embora o exercício físico não garanta a cura da doença, manter-se ativo fisicamente, principalmente em atividades de alta intensidade, tem um efeito protetor contra o câncer de próstata. É importante que haja um acompanhamento médico para definir como será a execução dos exercícios, com instrução de frequência, volume e intensidade dos treinos.
- Antes de começar a se exercitar, é importante que os homens com essa doença conversem com seus médicos para escolherem um programa de exercícios que gostem e que seja sustentável para manter. É importante não começar exagerando, focando em ter um plano de ação cuidadosamente pensado que atenda ao objetivo desejado e possa ser incorporado facilmente no dia a dia - finaliza Mitchell Humphreys.
Fontes:
Ricardo de Andrade Oliveira é médico endocrinologista e do esporte, ex-professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e coordenador do Departamento de Doenças Associadas da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso).
Clayton Macedo é médico endocrinologista e do esporte, chefe do Núcleo de Endocrinologia do Exercício e coordenador do Ambulatório de Endocrinologia do Exercício na Unifesp, coordenador do Departamento de Atividade Física da Abeso e membro do Departamento de Diabetes, Exercício e Esporte da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD).
Mitchell Humphreys é médico urologista, professor e presidente do Departamento de Urologia da Mayo Clinic, editor e revisor de diversos periódicos internacionais de urologia e membro ativo do consórcio de pesquisa americano focado em pedras nos rins - Endourology Disease Group for Excellence (EDGE). Atua também no Conselho de Diretores da GSD Healthcare, LLC, promovendo iniciativas de saúde básica em áreas carentes e pobres em todo o mundo.