13/07/2018 - Por: G1

Microencapsulação está entre as tecnologias utilizadas e pesquisas no ITAL, em Campinas (SP), para a melhoria de alimentos (Foto: Fernando Evans/G1)

Balas, chocolates, enlatados… É só dar uma rápida volta em qualquer supermercado para observar que o espaço destinado aos alimentos industrializados é maior que a área onde estão frutas, legumes e verduras. Da mesma forma que a tecnologia ajudou a proporcionar tais facilidades, ela também é a aposta para melhorar e dar funcionalidades a esses produtos que se tornaram tradicionais.

Em Campinas (SP), pesquisadores da Unicamp e do ITAL (Instituto de Tecnologia de Alimentos) trabalham para desenvolver alimentos funcionais, com maior qualidade nutricional e que possuam ou proporcionem uma melhor experiência sensorial para os consumidores.

“Pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a pessoa deveria comer cinco porções de fruta por dia para ter todos os micronutrientes e outras substâncias essenciais para o corpo funcionar bem. No Brasil, no entanto, apenas 18% das pessoas conseguem fazer isso. O que quer dizer que o resto da população vai acessar outros alimentos. Aí que entra a ideia de melhorar a formulação desses produtos para que, de alguma forma, possam agregar algo saudável”, explica a pesquisadora Izabela Alvim, do ITAL.


Bom e gostoso

Professora orientadora da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA), da Unicamp, Helena Bolini conta que mais de 100 produtos diferentes estão em desenvolvimento na universidade.

“Além de melhorar a qualidade nutricional, também trabalhamos a parte sensorial. Ao consumir um alimento melhorado, a pessoa deve ter a mesma experiência que tinha com o convencional, que está acostumada a utilizar”, conta.

A professora destaca que um trabalho de doutorado realizado na FEA apresentou um molho de tomate com redução de sódio. A ideia é oferecer, em um breve espaço de tempo, uma alternativa mais saudável para um produto que é consumido na maioria das casas.

“É um molho pronto, rico em compostos que são próprios do tomate, como o licopeno, que é fantástico do ponto de vista nutricional, antioxidante, com muita vitamina A, além de possuir menos sódio que o produto convencional”, diz.

O laboratório da FEA, explica a professora, é referência na América Latina em medir a qualidade e a intensidade de todas as características dos alimentos. “Temos softwares específicos para medir desde a aparência a textura e aromas. E temos os testes com as pessoas.”

E até nos testes com consumidores a tecnologia auxilia o desenvolvimento de novos alimentos. Helena destaca que uma das etapas de criação do molho de tomate incluiu exames para mensurar a resposta de quem provava o produto.

“As pessoas foram submetidas a eletroencefalogramas enquanto provavam o molho. Isso serviu para examinar as reações, para ver se reagiam da mesma forma de quando consumiam o produto convencional. A resposta foi ótima”, diz.


High-tech

No ITAL, em Campinas, a pesquisadora Sílvia Sobottka Moura desenvolveu um trabalho para agregar os benefícios do extrato de hibisco a alimentos industrializados. “O extrato de hibisco possui alta capacidade antioxidante e esse efeito pode estar ligado à presença de antocianinas, uma importante alternativa para a substituição de corantes”, explica.

No entanto, o extrato é “instável” na presença de oxigênio, açúcar, variação de temperatura, entre outros fatores. E o desafio da pesquisadora foi encontrar uma forma de garantir que a substância continuasse disponível no alimento após seu processo de industrialização.

Foi aí que Silvia utilizou a microencapsulação, um processo que consiste em “proteger” a substância em uma espécie de gel, sem comprometer sua funcionalidade. O extrato foi aplicado na preparação de balas e iogurtes, sem interferir no sabor

“Ficou um produto diferente que, além de ter essa característica de saúde, funcional por causa dos benefícios do extrato, também ganhou uma coloração, já que a partícula tem a cor rosa. E esse foi outro ganho. Atualmente há uma busca pela substituição de todo e qualquer produto artificial por um natural. E ele também substituiu a aplicação de corantes.”

A bala e o iogurte funcionais foram testados por consumidores.“As amostras com partículas apresentaram cor mais intensa e melhor aceitação sensorial com atitude positiva de compra para 75% dos consumidores no teste com as bala e 83,6% para os consumidores no teste com o iogurte”, explica.


Microencapsulação

O processo de microencapsulação, explica Izabela Alvim, é uma forma para criar essa “estrutura de proteção” aos componentes que se deseja agregar aos alimentos.

“Se você compra uma couve, é só observar que de quatro a cinco dias ela ficará amarelada. O verde vai embora. Aquele corante natural foi perdido. Substâncias naturais não sobrevivem muito bem sozinhas”, destaca.

Com a microencapsulação, é possível proteger antioxidantes naturais, importantes para o funcionamento do organismo, e vitaminas, além de agregar mais funções, como um corante ou até aroma natural.

O desafio dos pesquisadores é fazer isso sem interferir negativamente no produto. “Imagine acrescentar óleo de peixe, rico em Ômega 3, em uma barra de cereal? Certamente a substância tem cheiro e gosto de peixe. Ninguém comeria assim. Para dar certo, precisamos criar uma estrutura que preserve o componente não só no processo de fabricação, mas essa micropartícula deve ser resistente na hora do consumo, para não liberar o gosto na boca, e, sim, só depois de engolida, no sistema digestivo”, completa Izabela.


Cook-in-Air

Mais do que tecnologia, o avanço no setor de alimentação também precisa de boas e inusitadas ideias. O engenheiro de alimentos Geraldo Cia, de 70 anos, apostou na criação de um novo método de preparação de alimentos e até patentou um processo que denominou de Cook-in-Air.

A ideia, ele conta, surgiu há quase 20 anos, quando ainda trabalhava em uma grande companhia do setor alimentício. Saiu do papel, no entanto, anos depois, após pesquisas no ITAL e o desenvolvimento por conta própria.

O sistema consiste em realizar a preparação de alimentos em uma embalagem fechado, cozinhando sob pressão, garantindo a preservação do alimento por longos períodos sob refrigeração. Criou e emplacou a ideia ao abrir um ponto de venda em Campinas (SP).

O carro-chefe e inspiração foi a feijoada, prato típico brasileiro. “E é um processo que se adequou bem a esse tipo de produto, que mescla uma quantidade de ingredientes sólidos e líquidos, e preparados em pequenas porções”, conta.

Inquieto, Cia segue trabalhando para adequar o processo que desenvolveu na preparação de outros pratos. Ele já vende risoto, caldos e até sobremesa prontas, no “saquinho”. “Não tem nenhum contato com o ar”, garante.